quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Ministério Público investiga restauração do Arcebispado de Maceió

Alexandre Norberto

 

O Ministério Público Estadual (MPE) investiga 
inadequações dos trabalhos de restauro e requalificação 
do Arcebispado de Maceió.
A intervenção do MPE se dá em razão da representação impetrada pelo arquiteto autor do projeto licitado, Roberto Costa Farias, ao ter verificado na obra 26 irregularidades que põem em risco o interesse público de conservação do monumento, fato que ensejou o tombamento da edificação e justifica o emprego de recursos federais e estaduais na obra.
Serão gastos cerca de um milhão e duzentos mil reais, dos quais R$ 206 mil são repassados pelo Governo do Estado, através da SECULT, e o restante foi viabilizado junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, com autorização do Ministério da Cultura.
A restauração do imóvel está atrasada há dois meses. Ter extrapolado o prazo de um ano não seria o problema, tendo em vista que os trabalhos foram paralisados por quase 60 dias, logo no início, quando os fornecimentos de água e energia do prédio foram interrompidos.
Acontece que hoje, o que se vê no local ainda é um canteiro com as tarefas em estágios iniciais. Por exemplo, há pontos abertos no telhado ao longo de todas as dependências do pavimento superior, que deixa a ambientação interna vulnerável às intempéries, como vento forte e chuvas.
Na última sexta-feira, 10 de junho, o Promotor de Justiça que preside o Inquérito Civil Público, Alberto Fonseca, realizou a segunda inspeção nas instalações do prédio. Ele próprio havia se referido anteriormente ao canteiro como “a casa de horrores da Família Adams”, dado ao que pôde observar na primeira vez em que esteve no local, em abril, quando a obra completava um ano.
A nova visita constatou que boa parte das inadequações foi tratada. “Houve uma melhora substancial do que encontramos na primeira visita”, disse o Promotor. Compareceram também à ocasião o arquiteto, Roberto Costa Farias, o Secretário de Estado Adjunto da Cultura, Álvaro Otacílio de Araújo Vasconcellos Neto e o responsável pela Torres Construções & Empreendimentos (empresa responsável pela obra), Luciano de Oliveira Torres.
Também chamou atenção o fato de que nenhum representante da Arquidiocese acompanhou a diligência, já que o imóvel a ser restaurado pertence à Igreja Católica. O próprio Arcebispo, Dom Antônio Muniz, confirmou à reportagem saber que os trabalhos seguem arrastados e em padrão desorganizado, mas envolve-se pouco e confia o andamento do restauro à fiscalização pela SECULT e agora pelo MPE . “Não estou a par de todos os detalhes da investigação, a Arquidiocese está desejando que o prédio seja recuperado e entregue”, reconheceu.
“Desastrosa Condução”
Com a finalidade de investigar oficialmente as inconformidades apontadas, foi instaurado pelo MPE o Inquérito Civil Público n. 33/2011 e destacam-se especialmente entre as considerações que determinam sua abertura as de que “em face da desastrosa condução da obra e completa ausência de ação fiscalizadora do Estado consistentes nas seguintes ações e omissões: ignorância completa do projeto arquitetônico de restauro licitado (...)”, a Portaria segue elencando todos os desajustes. Também anotaram estarem ausentes do sítio de restauro o Livro de Ocorrências e o Diário de Obras, dois documentos necessários ao exercício de fiscalização. Essas aferições foram registradas na ocasião da visita do Promotor ao imóvel, em 12 de abril de 2011.
Os apontamentos que caracterizam essa “desastrosa condução” é o que dão substância à representação impetrada pelo arquiteto responsável pelo projeto licitado. São demonstradas, no relatório circunstanciado fornecido ao MPE, constatações como rachaduras e fissuras que passaram a existir após o início da obra, sem nenhuma iniciativa de contê-las, bem como o comprometimento da estrutura do edifício de forma geral pela desestruturação gradativa do telhado, do madeiramento e dos forros, além de infestação de cupins na coberta e paredes, inclusive naquelas que receberam o reboco novo, inexistindo qualquer medida de combate ou barreiras à progressão dos focos.
Essas constatações levaram o MPE a considerar a obra a maior ameaça ao monumento, uma vez que é realizada desconsiderando totalmente as técnicas e procedimentos especiais exigidos pelos preceitos da arquitetura nacional em trabalhos de restauro de edifícios tombados pelo patrimônio histórico.
Outras situações intrigantes aparecem na história dessa obra. Quando constatou as inconformidades do trabalho de restauro, em meados de outubro do ano passado, Roberto Costa Farias procurou comunicá-las aos gestores da Secretaria de Estado da Cultura, mas, de acordo com ele, encontrou dificuldades para estabelecer o contato. A reportagem teve acesso aos expedientes impressos e emails trocados entre o arquiteto e a assessoria do órgão, que terminaram apontando toda a coleção de inobservâncias que agora são investigadas pelo MPE.
Também foi neste ínterim que o autor tomou conhecimento de que a assessora especial da SECULT, Adriana Guimarães Duarte, havia implementado alterações no projeto original, sob a justificativa de serem adequadas às necessidades do canteiro. Roberto Farias também comentou que tal intervenção vai de encontro ao seu direito autoral, como pai do Projeto Arquitetônico, e que as modificações deveriam ter sido submetidas ao seu exame, conforme determina o estatuto profissional vigente.
A assessora Adriana Duarte, que é arquiteta especialista em restauro, afirmou ter requerido do autor as complementações do projeto e jamais as recebeu. “Ele se negou a fornecer os detalhamentos, apesar de termos destacado a urgência da necessidade. Como a obra precisava continuar, nós fizemos um novo projeto e então começaram todos esses problemas com o MPE”, defendeu-se.
Ao considerar seu envolvimento com a restauração do Arcebispado, tendo em vista o modo como são conduzidas as tarefas pela Torres, Roberto Farias é categórico: “A situação requer a estruturação imediata de ações que contenham o dano perpetrado pela irresponsabilidade no andamento dos trabalhos que só tem trazido máculas ao monumento e, portanto, à nossa memória e identidade coletivas, parando o descaso e o desrespeito.”
Trajetória do prédio
O Arcebispado de Maceió é uma edificação da década de 1930 e serviu como residência para os Arcebispos enquanto em uso. Abandonado há cerca de duas décadas, foi tombado pelo Patrimônio Histórico do Estado com a pretensão de ser restaurado, por ser de interesse público sua conservação.
O Projeto Arquitetônico de restauro vislumbra a reutilização do imóvel como a Escola Arquidiocesana de Artes e Ofícios Dom Santino Coutinho que atenderá também jovens expostos ao risco social, oferecendo cursos profissionalizantes gratuitos na área de restauração de vários materiais como azulejos, esculturas, telas, etc. Essa requalificação visa a manter a sustentabilidade e a funcionalidade do imóvel de modo a prevenir uma nova deterioração ou abandono.
A responsabilidade pela obra pertence à Torres Construções e Empreendimentos Ltda., empresa vencedora do processo licitatório, cujos trabalhos tiveram início em abril de 2010 com prazo de um ano para conclusão.
De acordo com seu responsável, Luciano de Oliveira Torres, o Arcebispado deverá ser entregue à sociedade em agosto deste ano, porém necessita de mais R$ 400 mil para que consiga entregá-la da maneira que considera ideal e adequada.

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